16 de set. de 2011

Coluna de Quinta: Quando um número bastava

Por Vinícius Peraça

Houve um tempo – e não faz muito – em que o futebol não era tão burocrático quanto hoje. Um tempo em que as coisas eram claras e simples. Nada de grandes teses, teóricos engravatados e atletas balaqueiros rodeados de agentes e assessores. O jogo de bola era mais simples e, portanto, mais atrativo e apaixonante. 

Digo isso baseado em algumas observações sobre o atual ambiente futebolístico. Entrevistas, por exemplo. Tente assistir a um destes programas de TV que fazem um balanço após uma rodada de jogos e vai ter a prova de que, sim, existe algo mais repetitivo do que os roteiros de novelas das oito.

Técnico do time perdedor: - Não gosto nem quero falar de arbitragem, mas fomos prejudicados com um lance de pênalti claro a nosso favor no primeiro tempo que não foi marcado!
Autor do gol da vitória: - Sabíamos da dificuldade que iríamos encontrar, mas graças a Deus conseguimos fazer um bom jogo e conquistar os três pontos. 
E por aí vai.

Mas nada resume tão bem o quão chato vem se tornando o futebol quanto as novas teorias que aparecem. Tal qual coleções de roupas, entram na moda, permanecem por um tempo e depois são superadas por outras tão esdrúxulas quanto a anterior. Tempos atrás chegou-se ao absurdo de circular entre técnicos e comentaristas a ideia de que um bom atacante não precisaria fazer gols. Bastaria “prender os zagueiros”. Se é para prender alguém, que se contrate um policial, oras! Atacante tem é que fazer gol. De barriga estilo Renato Gaúcho ou de bunda como o Muller, pouco importa. Como diria Dadá, “feio é não fazer gol”.

Nesse mesmo sentido da reinvenção do ludopédio, agora é consenso que cada jogador do time precisa ter numeração fixa. Se a intenção é criar uma identificação para a torcida, tudo bem. Mas o tiro está saindo pela culatra. A maioria das equipes entra em campo com uniformes padrão futebol americano. 27, 56, 32, 45... A escalação mais parece um sorteio da Tele Sena. Só falta o finado Lombardi! 

Quem consegue saber a posição em que joga um sujeito que leva às costas o número 45?! Houve um tempo em que um boleiro era definido com um número. Você chegava no estádio, via um jogador aquecendo e perguntava ao vizinho na arquibancada: 
- Quem é aquele ali com a bola? 
- É o Valdir. 
- Não conheço. Joga de quê? 
- É um oito. 

Pronto, tudo estava explicado. Ninguém precisava ficar dizer que o Valdir era um segundo volante canhoto que veio do Noroeste, tinha um bom desarme e marcava em média 0,23 gols por partida. Era desnecessário. Todo mundo sabia o que um oito fazia. 

O mesmo valia para o sete, o dez, o nove. Quando um guri chegava para treinar pela primeira vez em um clube, bastava o técnico estabelecer o número da camisa e o candidato a craque já sabia o que precisava fazer. Hoje tudo gira em torno de palestras, apresentações em powerpoint com disposição tática, vídeos motivacionais. Um grande embuste! 

Houve um tempo em que o futebol era divertido, excitante. Feito para ser jogado por todos. Agora não. Grandes sabichões estão transformando tudo isso em teses quilométricas e conceitos que mais parecem as maçantes e inúteis (?) equações do tempo de escola. Bem diferente do tempo em que números comuns, de um a onze, bastavam para fazer a alegria da gurizada.


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3 comentários:

Gislene Farion disse...

Muito bom!

José Leonardo disse...

Parabéns Vinícius! É isso mesmo que acontece com o nosso Futebol. Também tem analistas de futebol nas nossas Tvs. que nunca chutaram uma bola e dão palpites bestas sobre futebol, a nossa sorte que ainda existem Damiões e Andrés Limas que ainda fasem gol, que é o que todo torcedor gosta de ouvir e ver.

lulu disse...

Realmente.O futebol de hoje perdeu toda a sua originalidade.